quinta-feira, 16 de dezembro de 2010





Tribunal Administrativo
do Círculo de Lisboa




Acórdão do Tribunal Administrativo n.º 45/2010

Processo nº XXXXXX/10 – Pleno da 1ª Secção

Acordam, em conferência, no Pleno da 1.ª Secção do Tribunal Administrativo:


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Dirige-se a este tribunal a sociedade comercial Somos da Inteira Confiança, Lda., para requerer a anulação de contrato celebrado entre o Ministério da Administração Interna e a sociedade comercial A Tempo e Horas, Lda., referente à adjudicação de dois veículos blindados, invocando para tal a invalidade do acto pré-contratual, feito por ajuste directo, por se sentir lesada pelo mesmo.




Dos factos Provados:


·          O Ministério da Administração Interna (MAI) adjudicou à sociedade A Tempo e Horas, o fabrico de dois veículos blindados, por ajuste directo, pelo valor de 400.000,00 euros.

·          O MAI não fez qualquer contacto formal com outra empresa em vista a alargar o número de interessados para adjudicação do fabrico dos ditos blindados;

·          No mencionado contrato acordou-se a entrega dos veículos blindados até ao dia 15 do mês de Novembro de 2010, com o propósito de serem usados durante a Cimeira da NATO, que ocorreu entre os dias de 19 a 20 de Novembro;

·          Os veículos só foram entregues no dia 22 de Novembro;

·          O MAI classificou o negócio como secreto, invocando para tal razões de segurança, fundamentadas em comunicados da Polícia Judiciária e da Interpol que confirmaram a existência de suspeita de ameaças de um grupo terrorista, denominado por KGP, à sabotagem da compra dos blindados;

·          A sociedade Somos da Inteira Confiança, Lda. tem por objecto social a comercialização, importação e exportação de equipamentos motorizados para segurança e defesa militares, bem como, presta assistência técnica e reparação de equipamentos motorizados para segurança e defesa militares (artigo 3º do contrato de sociedade por quotas da referida sociedade);

·          Ficou provado que o negócio em litígio chegou ao conhecimento do público em momento anterior ao da realização da Cimeira da NATO.



Das questões de mérito:


– Cumpre, primeiramente, apreciar da validade da decisão do Réu de conceder por ajuste directo, o fabrico dos dois veículos blindados.

– De facto, o artigo 24º, nº 1, alínea f), do Código dos Contratos Públicos (CCP), possibilita à entidade adjudicante adoptar o instituto do ajuste directo, em detrimento de procedimento concursal, para a formação de qualquer contrato, desde que, “nos termos da lei, o contrato seja declarado secreto ou a respectiva execução deva ser acompanhada de medidas especiais de segurança, bem como quando a defesa de interesses essenciais do Estado o exigir”.

– Esta norma remete-nos para a Lei do Segredo de Estado (Lei nº 6/94, de 07 de Abril). Nos termos deste diploma legal, “são abrangidos pelo segredo de Estado os documentos e informações cujo conhecimento por pessoas não autorizadas é susceptível de pôr em risco ou de causar dano à independência nacional, à unidade e integridade do Estado e à sua segurança interna e externa.” (artigo 2º, nº 1 da Lei do Segredo de Estado).

– Importa, portanto, verificar se, com base nos fundamentos que o Réu invocou para declarar o contrato secreto, que nesta sede se impugna, estão preenchidos os requisitos acima elencados.

– Veja-se então, se as suspeitas levantadas pelas autoridades policiais supra mencionadas, que foram razão determinante para o Réu classificar o negócio da compra dos blindados como secreto, poderiam, constituir razão bastante para que o procedimento prévio contratual adoptado fosse o do ajuste directo, nomeadamente, importa apurar se o procedimento pré-contratual escolhido tivesse sido o concurso público, a probabilidade de essas suspeitas se materializarem seria maior.

  – Manifestamente, pelo que já se deu como provado, os contornos fundamentais do negócio que ora se discute, nomeadamente a identificação do adjudicatário, ATH, Lda., eram do conhecimento público, daqui resultando que a intenção de envolver o negócio em total secretismo fracassou, e disto não resultou, como é sabido, qualquer tentativa de danificar ou destruir os afamados blindados.

– Do mesmo modo, é do entendimento deste tribunal, que as suspeitas levantadas, não constituiriam fundamento suficiente para que se considerasse ser esta uma situação susceptível de representar risco, ou de possível dano, para a independência nacional, ou à integridade do Estado e à sua segurança interna ou externa.



Da decisão:


            Pelo exposto se conclui que o procedimento pré-contratual que legalmente se impunha ter sido adoptado era o concurso público, nos termos do artigo 21º, número 1, alínea b), por exclusão da alínea a) e pela não verificação de qualquer das situações previstas no artigo 24º, todos do CCP.

            A não observância das normas legais relativas ao procedimento pré-contratual, resulta na anulabilidade do mesmo (artigo 135º, do CPA) e por conseguinte na anulabilidade do contrato que se lhe seguiu (artigo 283º, nº 2 CPP).


Condene-se os Réus nas custas, observando-se a regra do artigo 446º-A, do Código de Processo Civil.




Registe e Notifique.



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Lisboa, 16 de Dezembro de 2010

Os Juízes

Ana Moura
Cláudia Pincho
Miguel Mano

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