sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Contestação do Governo

Exmo. Senhor Doutor Juiz de Direito

do Tribunal Administrativo

do Círculo de Lisboa

Ministério da Administração Interna, sito na Praça do Comércio – Ala Oriental, 1149-018, Lisboa,

Vem contestar as acções à margem, que lhe movem a empresa “Somos de Inteira Confiança, Lda.” e o cidadão Francisco Esperto, melhor identificadas nos autos;

I – Questão Prévia

1.º

Sendo o Estado uma entidade que deve velar pelos interesses públicos, harmonizando os mesmos, com os interesses dos particulares, cabe-lhe a ele próprio criar as condições necessárias para que os particulares intervenham no âmbito administrativo, participando activamente, na tentativa de podermos ter uma maior e melhor proximidade do Estado para com os seus cidadãos, é de facto salutar que os mesmos façam uso dos meios ao seu dispor, para dizerem de sua justiça, no que concerne à gestão pública.

2.º

No entanto, não obstante ser de louvar a dita intervenção dos particulares, cabe ao Ministério da Administração Interna, como representante do Estado e pessoa de bem, explicitar aos seus cidadãos, de forma responsável, séria, experiente e clara, que muitas vezes a comunicação social (o dito 4.º poder), como certamente compreenderão, não recebe do Estado todas as informações prementes na segurança e interesse do país, cabendo ao Governo procurar a melhor forma de encontrar soluções temporal e espacialmente mais vantajosas para a República Portuguesa.

II – Dos Factos

3.º

Não obstante os factos invocados em ambas as Petições Iniciais (P.I.), cabe ao Estado velar pelo superior Interesse Público, traduzido muitas vezes na não divulgação geral propositada de certos aspectos/condições negociais.

4.º

Como tal, e, como diz o Povo “o segredo é a alma do negócio”, certamente se compreenderá que o Ministério da Administração Interna, como representante do Estado, no exercício das suas funções, não descurando o Direito à Informação dos Particulares, mas tendo em conta o Superior Interesse Público, há certas condições negociais que necessitam ficar sob sigilo das partes contratantes. Como se percebe, a Certidão emitida a pedido do cidadão Francisco Esperto, como o próprio diz “vem confirmar o que era do conhecimento geral através da comunicação social…”, e que “O prazo limite de entrega do equipamento era o dia 15 de Novembro de 2010…”, factos que se confirmam, mas que no entanto não obstam à contestação que ora se profere.

5.º

Desta forma, justificando as dúvidas levantadas quer pela empresa “Somos de Inteira Confiança, Lda.” quer pelo cidadão Francisco Esperto, não nos resta outra hipótese, senão passar à dupla contestação, nos termos dos Art. 83.º do Código de Procedimento nos Tribunais Administrativos (CPTA) e 486.º e seguintes do Código de Processo Civil (doravante CPC) solicitando desde já, um escrupuloso cumprimento do Segredo de Justiça, uma vez que, somente devido a esta litigância em que nos vemos envolvidos, iremos revelar a terceiros os pormenores por detrás da aquisição dos blindados que tanta polémica parecem levantar.

6.º

Consideramos sem efeito as pretensões formuladas, pelo que se vem requerer a absolvição do Réu do pedido nos termos de defesa por excepção peremptória extintiva (art. 487.º n.º 2 do CPC).

7.º

De facto, um dos intuitos da aquisição dos blindados era a sua participação na Cimeira da NATO, não sendo, no entanto, o único.

8.º

Com efeito, muito antes da famigerada cimeira, a República Portuguesa teve contactos diplomáticos com o Governo do Estado de Israel e do Estado de Omã, os quais, em virtude da grande fama granjeada pelos povos lusitanos ao largo de todo o Mundo, reiterada recentemente pelo grande sucesso das nossas missões no Iraque, Bósnia e Afeganistão, levaram a que os Estados citados manifestassem interesse na aquisição dos nossos veículos blindados, tendo feito propostas de valores incrivelmente mais elevados do que o valor comercial dos mesmos veículos.

9.º

Assim, foi estratégia do Ministério, testar os ditos veículos durante a cimeira da NATO e após a mesma, decidir então que proposta de compra aceitar, ou a venda dos novos blindados ao Governo de Israel, ou os antigos, que já possuíamos, de antemão, ao Governo de Omã.

10.º

O Ministério somente não emitiu nenhum comunicado sobre esta matéria, uma vez que a mesma somente ficou dentro dos corredores do próprio Ministério, por razões negociais, de segurança e credibilidade públicas. Certamente se compreenderá que, caso os restantes membros da NATO soubessem que o Estado Português tinha já, propostas para vender os seus novos blindados, isto iria conduzir a uma tremendo desprestígio nacional na cena mundial, o que não é, de todo, desejável, e que faria perder credibilidade e deitaria por terra a possibilidade de frutuoso negócio com o Estado israelita. Outra questão desconhecida da opinião pública, prende-se com questões de segurança, pois em virtude desta aquisição de blindados pelo Estado Português, existiram rumores comprovados quer pela Interpol, quer pela Polícia Judiciária, de que o grupo terrorista KGP (“KinG Putin”), estaria a preparar sabotar a compra dos ditos veículos.

11.º

Desta forma, sendo certo que os ditos blindados não chegaram a tempo da Cimeira, ao contrário do que é referido pelo caro cidadão Francisco Esperto o interesse na aquisição dos mesmos manteve-se, pois, além da Cimeira, o nosso País tem outros eventos onde os mesmos irão ser necessários e, ainda que se revelem desajustados às nossas pretensões, o Estado de Israel continua tremendamente interessado na aquisição dos mesmos, pois afirma em nenhum lado poder encontrar tão bons e tão capazes, em tão pouco tempo, tendo rejeitado até, todas as ofertas de venda dos mais variados países.

12.º

Não se verifica assim, ao invés do reiterado pelo referido cidadão, “uma lesão desnecessária do erário público”, mas antes um dos melhores negócios da história do Estado Português, uma vez que podemos testar veículos blindados dos mais modernos que existem e, decidir, sem qualquer risco, se ficamos com eles ou não.

13.º

Quanto à afirmação da empresa “Somos de Inteira Confiança, Lda”, de que poderiam ter produzido os referidos veículos a tempo da cimeira, caso não tivesse havido ajuste directo, é uma afirmação que, para além de insustentável, nos parece fundada em má fé. O Ministério da Administração Interna recorreu ao ajuste directo para contratar com a empresa “ATH”, somente após contacto telefónico com a sede da empresa “Somos de Inteira Confiança, Lda”, onde questionámos acerca da possibilidade de a mesma empresa produzir os veículos com as características pretendidas, a tempo da Cimeira, questões às quais o seu representante, que se identificou como TóZé nos respondeu bruscamente: “Epá nem penses nisso”.


III – O Direito

14.º

O autor, a empresa “Somos de Inteira Confiança, Lda”, vem propor o processo, em acção administrativa comum, que, nos termos do art. 5.º do CPTA, relativo à cumulação de pedidos, sendo certo que a forma de processo aplicável seria a forma especial.

15.º

Relativamente ao autor Francisco Esperto, este intenta contra o governo uma providência cautelar para suspensão imediata dos pagamentos em falta à empresa de blindados “A Tempo e Horas.

Não nos parece que tal deva ser procedente. O caro cidadão intenta uma providência cautelar conservatória (com vista à suspensão do acto de pagamento), art. 112.º n.º 1 CPTA, e, de facto a legitimidade para o fazer não se questiona, no entanto, há um requisito que o mesmo não considerou, designadamente a identificação dos contra-interessados, art. 114.º n.º 3 d) CPTA, que origina despacho de rejeição art. º 116.º n.º 2 a) CPTA, logo teria 5 dias para suprir a falta e não fez, desta forma, por aplicação do art. 114.º n.º 4 CPTA, não deve proceder.

16.º

Não obstante o disposto no art. 3.º do Código do Procedimento Administrativo (CPA), art. 266.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP), art. 7.º CPA, 9.º e 62.º do mesmo código, que estabelecem o dever de resposta do Estado quando questionado pelos particulares. De acordo com o art. 4.º CPA, 266.º n.º 1, 156.º alínea d) e 164.º a) e 282.º todos da CRP, vemos que até ao nível da declaração de inconstitucionalidade de certas normas, o interesse público deve ser ponderado, ora já se vê o alcance que tal princípio pode atingir. Creio o meritíssimo Juiz certamente analisará esta litigância, pelo ponto de vista do Superior Interesse Público, tendo em conta os motivos expostos ao longo do articulado. Interesse Público este, que, como se referiu ao longo do explanado, em nada prejudicou os particulares e que, caso não tivesse sido respeitado, teria colocado em causa uma excelente oportunidade de negócio e de credibilização internacional para o Estado Português e, consequentemente também para os particulares.

17.º

Há que referir, na mesma medida, os arts. 156.º d) e 164.º a) CRP, na medida em que nos falam do Segredo de Estado, este que tem que ser invocado nesta sede, na medida em que nem os particulares, nem a comunicação social, nem sequer a empresa “ATH” tiveram conhecimento do circunstancialismo por detrás da aquisição dos blindados, por motivos, não de os prejudicar, mas sim, de beneficiar todos, em conjunto, ao proporcionar ao Estado uma magnifica oportunidade, como vem sendo dito.

18.º

Quanto à contenda levantada pela empresa “Somos de Inteira Confiança, Lda”, relativamente ao ajuste directo, argumentando que tal não seria possível, esta é uma posição que tem, necessariamente que ser impugnada. Primeiro, porque a empresa afirma que poderiam ter havido outras empresas convidadas e, como já foi explicado, à data da celebração do contrato a empresa “ATH” era a única que apresentava condições para produzir os blindados com as características pretendidas. Relativamente à possibilidade ou não, de fazer uso do ajuste directo, ele é perfeitamente possível por recurso ao art.º 112.º, 23.º e 24.º alínea f) do Código dos Contratos Públicos (CCP), derivado dos motivos supracitados, relacionados com a questão da comunicação da parte da Interpol ao Governo Português.

19.º

Como tal, e seguindo o entendimento da nossa melhor doutrina, as nossas afirmações parecem não ser mais que uma defesa convicta e perfeitamente fundada na verdade dos factos. Demonstra, portanto, o Réu não ter agido com quaisquer artifícios dolosos nem ainda negligentes para a ocultação da verdade, não fundamentando qualquer obstáculo à decisão do tribunal, ao contrário do que se passou com a autora supracitada.

IV – Litigância de Má Fé

20.º

Por tudo o que foi afirmado, parece ser de exigir a condenação da autora, empresa “Somos de Inteira Confiança, Lda”, em litigância de má fé, uma vez que nos termos do art. 456.º n.º 2 b) do CPC, a autora demonstra ter alterado a verdade dos factos, recorrendo ao uso de declarações duvidosas, consubstanciando a má fé material.

21.º

Para além disso, estes conhecem perfeitamente a falsidade das suas declarações, pois sabem na perfeição que aquando de contacto telefónico rejeitaram liminarmente produzir os pretendidos blindados, por incapacidade quer de tempo, quer de arte.

22 .º

Requere-se assim, a sua condenação em litigância de má fé.

V – Da Prova

23 .º

Recorremos em primazia à prova testemunhal, uma vez que, quanto a algumas situações é a única possível e, porque ainda acreditamos que a palavra das pessoas tem valor jurídico.

Desta forma, arrolam-se as seguintes testemunhas, (com possibilidade de alteração até à data da audiência de julgamento):


- Yasser, Embaixador israelita em Portugal e intermediário nas negociações com o Estado português relativamente à questão dos blindados;

- Diouf, Embaixador de Omã em Portugal, e intermediário nas negociações com o Estado português relativamente à questão dos blindados;

- Roberto Pereira da Silva, representante do Ministério da Administração Interna, nas questões supracitadas;

- ToZé, representante da empresa “Somos de Inteira Confiança, Lda”, com o qual contactamos previamente à aquisição do material em questão;

Junta ainda procuração e dois documentos, enviados em anexo.


Os Advogados,

Luís Epifânio,

Emaús Silva e

Deusa Camará

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