quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Caso prático

Proposta de resolução

Condenação à prática de acto administrativo legalmente devido

II

Alberto dirigiu aos serviços competentes do Ministério da Agricultura um pedido de subsídio na sequencia de uma praga de insectos que lhe destruiu toda a sua produção vinícola.

Tendo já decorrido seis meses sem que obtivesse qualquer resposta do Ministério, Alberto propôs uma acção administrativa especial com o objectivo de obter a condenação do Estado no pagamento do mencionado subsídio.

Em sua defesa alegou o Ministério que não tinha qualquer dever de responder a Alberto, tanto mais que, segundo a lei, este não teria direito ao subsídio. Mais alegou que sempre o meio processual escolhido seria desadequado uma vez que o pagamento de um subsídio não pode ser qualificado como acto administrativo.

Quem terá razão?

Em regra, o procedimento administrativo deve se concluído no prazo de 90 dias (cfr. n.º 1 do artigo 58.º do Código do Procedimento Administrativo [CPA]), suspendendo-se o prazo nos Sábados, Domingos e feriados (alínea b) do n.º 1 do artigo 72.º do CPA), salvo nos prazos legalmente fixados em mais de seis meses.

Trata-se de um corolário do princípio da decisão, ínsito no n.º 1 do artigo 9.º do CPA. Ainda, a Administração está vinculada a um dever de celeridade, imposto pelo artigo 57.º do CPA.

Partindo do princípio que o prazo à disposição do Ministério da Agricultura fora ultrapassado, assiste a Alberto o direito de instaurar uma acção administrativa especial para obter a condenação da entidade competente à prática de um acto administrativo ilegalmente omitido (cfr. n.º 1 do artigo 66.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos [CPTA]). Efectivamente, esta condenação pode ser pedida quando não tenha sido proferida decisão dentro do prazo legalmente estabelecido, após a apresentação de requerimento que constitui o órgão competente no dever de decidir (alínea a) do n.º 1 do artigo 67.º do CPTA). Aliás, o direito de acção tem de ser exercido no prazo de um ano a contar desde o termo do prazo legal estabelecido para a emssão do acto ilegalmente omitido (cfr. n.º 1 do artigo 69.º do CPTA).

Alberto dispõe de legitimidade activa por alegar ser titular de um direito dirigido à emissão desse acto (alínea a) do n.º 1 do artigo 68.º do CPTA). Tem legitimidade passiva o Ministério (cfr. n.º 2 do artigo 10.º do CPTA).

Não sendo competente o Supremo Tribunal Administrativo, nem os Tribunais Centrais Administrativos (cfr. artigos 24.º e 37.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais [ETAF]), é competente, em primeira instância, o tribunal administrativo de círculo da área da residência habitual de Alberto (cfr. n.º 1 do artigo 44.º do ETAF e n.º 1 do artigo 16.º do CPTA).

Naturalmente que o Ministério só seria condenado à prática do acto se este fosse legalmente devido, isto é, se compulsadas todas as normas legais aplicáveis isso conduzisse a que Alberto teria direito ao subsídio e fosse inequívoco o montante a que teria direito. Porém, mesmo havendo a necessidade de considerar que a emissão do acto pretendido envolveria a formulação de valorações próprias do exercício da função administrativa e a apreciação do caso concreto não permitiria identificar apenas uma solução como legalmente possível, o que faria com que o tribunal não pudesse determinar o conteúdo do acto a praticar, este deveria, ainda assim, explicitar as vinculações a observar pela Administração na emissão do acto devido (cfr. n.º 2 do artigo 71.º do CPTA). Coisa diferente será o caso de a lei não fazer nascer na esfera jurídica de Alberto qualquer direito subjectivo ao subsídio, caso em que o acto administrativo não é legalmente devido e, portanto, a Administração não pode ser condenada a praticá-lo e o pedido não pode proceder.

Em face do argumento, por parte do Ministério, de que não se trata de um acto administrativo, teria de se contrapor o conceito de acto administrativo do artigo 120.º do CPA, embora o objecto do processo seja a pretensão de um interessado e não o acto propriamente dito. Esta aliás, a grande revolução do contencioso administrativo que deixa de ser um processo ao acto, alargando os seus horizontes. Na verdade, a decisão a propósito do subsídio envolve, antes do seu pagamento, um acto administrativo que comporte a decisão respeitante à sua atribuição. Caso se tratasse apenas do dever de prestar um subsídio atribuído por acto administrativo anteriormente praticado, aí sim a acção correria na forma comum (cfr. alínea e), do n.º 2 do artigo 37.º do CPTA), sendo válido o argumento do Ministério.

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